quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

O PATRONO

O PATRONO

ELE CHEGOU A RIGOR
NA ESCOLA DE ZINCO DA FAVELA.

NO MAIOR DISSABOR,
MATUSQUELA,
MENTIU SOBRE SUA HISTÓRIA,
SEUS FEITOS E,
DURANTE A ORATÓRIA,
VIU A ESCOLA DESABAR.

UMA BALA NAS COSTAS
DE PT .45
SENTIU SEU PEITO ATRAVESSAR,

JUSTAMENTE QUANDO TODOS O APLAUDIAM...

DIZIA QUE
A BANDIDAGEM IA EXTERMINAR.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

NÁUFRAGO

NÁUFRAGO

UMA VELA ABERTA
NA GANGORRA DO MAR,
MEU CORAÇÃO SE APERTA
NO HORIZONTE ACHAR

TEU OLHAR SERENO
À ESPERA
UM NÁUFRAGO VISLUMBRAR,

Ó AMOR
QUE OS VENTOS ME LEVEM
À VIDA AZUL
SEM MORRER NO AZUL DO MAR,

ESCUTE AS ONDAS
O SILÊNCIO DOS LUARES,
SAIBAS QUE CONTO OLHARES
ATÉ QUE UM NA RETINA
SER O QUE SE APROXIMA
DA VELA ABERTA
EM TUA ILHA APORTAR.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Marchinha de Carnaval

Marchinha de Carnaval

BICHIM

meu gato virô couro
de cuíca e tamborim,
vô dar parte na polícia
quero ele de volta pra mim

vô dar uma de Bin Laden
mandá riscá o estopim,
vai passear nas nuvens
quem robô, robô o meu bichim

bichim, bichim, bichim
vem cá bichim,
quem te pegô
nas cinzas terá seu fim.
bichim, bichim, bichim...

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

A CHAVE MESTRA

A CHAVE MESTRA


trancado cândido ilhado
à baila canção de luz fulgura
ilumina a vida escura
do pensar seu enfado.

rebusca antigas miragens
apagando-as ensimesmado
razão com emoção mistura
avista o ermo doutras paragens

reflete o quanto tudo lhe basta
chora ao leito o trauma
se já toda beleza nefasta
encobre-lhe o resquício d'alma


perder-se-á em devaneios
se todos anseios
estão em dúbios meneios
de uma chave gasta?

-- e sua calma
portal de lugar nenhum
se fecha um a um
dorme consigo
no coração ratimbum!?

pobre cria
na noite vazia
trancou-se num zum!
remoeu-se emudeceu-se
flertou com a alegria
doutros preteridos
de sua vã filosofia.

a solidão é sua guia
leva ao seu interior
locais e eus
um a um devagar
vagar bem devagar...

CAMILA ALVES

CAMILA ALVES

camila alves rebolava, gracejava, oferecia-se
pro velhote da casa embolorada, ao lado de seu
barraco.

camila alves morava só, pois havia sido expulsa
de seu lar face a gravidez prematura.

camila alves, por 10 reais, fazia sexo oral a
qualquer um num canto qualquer.

precisava comprar leite pro nenê que nascera com
retardamento mental. precisa descolar um baseado.
precisava sobreviver sem dotes de experiência
trabalhista.


camila alves, 18 anos, judiou muito do velho impotente.
e o velho, de uma história sombria, um dia disse-lhe:

-- cria juízo, você tem a vida pela frente. abandone o
vício e esses vagabundos viciados.

ela riu, gargalhou.

-- sai pra lá velho careta! a vida é um momento muito
louco. ninguém quer adotar meu guri. é minha cruz
por ter dado a luz a um bastardo inocente. não
estudei. minha família tem aversão a mim. foda-se!

-- menina, vem ficar comigo. quero ser seu pai, pois
também não tenho ninguém. a decisão é sua.

camila alves desse dia em diante começou a pensar.
no começo, ainda, foi a algumas baladas e tantas vezes
chegou bêbada e drogada nas madrugadas.
vendo o amor que o velho tinha por seu filho,
começou a chamá-lo de pai. começou a vestir-se dignamente.
fez curso de informática e formou-se no segundo grau.
os amigos, aos pucos, perderam-se. alguns morreram
de overdose, outros, em confronto com a polícia.

camila alves estava feliz. o filho numa escola especial.
ela, em um emprego de secretária.

camila alves, com 24 anos, era dona do próprio nariz.
casou-se aos 30 anos. aos 34, separou-se do rapaz, o qual
apaixonara-se aos 14, e que tentava fazê-la regredir
à época perdida.

...

camila alves, hoje, tem 65 anos e as antigas tatuagens.
vive só. o filho faleceu há 15 anos.

camila alves, aposentada, faz tricô e pinta quadrinhos e
guardanapos para dar aos amigos e parentes.

camila alves, na sala, vê o quadro do velho fixado em cima
do relógio cuco. e todos perguntam: 'quem é?'

camila alves, pela primeira vez, fez uma oração. não pediu
nada. apenas agradeceu a chance que, meio à perdição, a
vida lhe oferecera e entristeceu-se por outras garotas
que não aproveitam, apenas reclamam, mas não tomam uma
atitude.

camila alves fundou, aproveitando sua grande residência,
um LAR DE AJUDA A JOVENS DEPENDENTES, indigentes e
excluídos. e, a todos, conta sua história com pormenores.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

AREALVA

AREALVA

foi de lá
de onde na imensidão
a vista se atrapaia
que bem-te-vi
que nem que um pássaro
caminhando pela praia
ó minha garça madrugadeira

então senti
nascer o sonho
morrer a guaia
no teu balé
de fêmea brejeira

nasci pra vida
outra se ensaia

ó relento das horas nuas
sais de vidas cruas
um dia terei a manta
no sol que se levanta
estendida pelas mãos tuas
nas areias alvas
do coração a mil


seguirei tuas pegadas
apagadas
pelas ondas em desvario,
e o calafrio
hóspede do peito vazio
fará da tempestade estio

se só por um momento
teu olhar ler o meu
tão pueril
no cio d'arte
na corrente deste rio
que longe vai
rompendo à distância
deste desejo tocar-te
inda na errância
beijar-te além Paraguai.


nota:
Arealva: areia alva das praias do rio Tietê, interior de SP - que deságua no rio Paraná, divisa com o estado de Mato Grosso.

O FIM DO ÚLTIMO

O fim do último



E chovia. Ele não se intimidava, ilhado, ali no aclive.
Era janeiro de 2031. Céu cinza. Arco-íris de retículas negras.
E chovia. Ele não se intimidava com as ratazanas famintas que aportavam.
Ligou o rádio de pilhas. Uma voz desesperada anunciava o fim dos tempos.
Acendeu um cigarro de palha. A bolha de pus e sangue vertia abaixo do umbigo.
Contorceu-se de dor. Aplicou na veia a última injeção de morfina. Adormeceu.
O mundo era o câncer; o câncer, sua última lembrança.
Despertou com as ratazanas roendo-lhe os pés e as espantou.
Ligou o rádio novamente. Estava mudo.
...
Instantes depois, saqueadores de ilhotas que se formaram com o dilúvio,
roubaram seu rádio, seu binóculo, suas roupas, seu chapéu dos tempos que
ganhava a vida como peão de rodeio: um ganho extra que doava ao leprosário.
Deixaram-no, ali , sem compaixão. Mijaram em sua chaga.
Meio aos últimos gemidos morreu, certo de que a humanidade não mudará jamais
mesmo numa situação limite.
No último olhar adorou os ratos.

Primeira Entrevista de Rehgge com o Diabo

Primeira Entrevista de Rehgge com o Diabo


Poema amoroso já não me causa impacto. Poema religioso, idem. Poema introspectivo, erótico, repetitivo, saudoso, esperançoso, espetaculoso, alegre, tristonho, furioso, reflexivo, agridoce, etc., e de agonia e êxtase – já não me causam impacto. Já escrevi centenas.
Aí o entrevistador me retruca:
-- Ô punheteiro das palavras, diga o que você quer?!
-- Quero fazer um poema acima do bem e do mal terreno. Isto é, desta dimensão – que seja como o perfume fenomenal, capaz de seduzir o mais frígido dos seres. Ah, meus poemas me são como gozos naturais, mas nunca me deram um orgasmo. Escrever, pra mim, é como ser dependente do álcool, da nicotina, do THC e outras drogas alucinógenas que só conheço em filmes atuais e retrôs; drogas sintéticas sei lá o que são. E você, ó, avesso bíblico, asa caída, quebrada, que foi atirado do céu sem ter o dom de voar? Acho que você bateu a cabeça e ficou lelé tal este mundo que desentendo.
-- Ah, mas de você quero um texto sanguinário, explosivo, tipo filme americano de sofreguidão e caos. Se você tiver um tempinho, me faça uns versinhos que lhe tirarei do anonimato.
-- Eia! Eia, 666! Tapa na oreia!!
...
Dei-lhe um tapa no pé do ouvido que a cabeça dele girou sobre o pescoço mais de cem vezes. Quando o rosto, travestido de boa fé, parou – borrifei ácido sulfúrico em seus olhos de peixe morto. Ele voou desconcentrado, meio pinel. Notei-o dar de cara na torre de celular e TV que captam sinais de satélite. Em seguida, despencou em cima da cerca elétrica e leu a
placa: “Sorria, você está sendo filmado.” Vi-o ligar um aparelhinho e gritar “socorro!, esse filha da puta de poeta é incorruptível, blindado!” Umas ideias bestas vieram-me à tona:
1 - Seria o Diabo um alienígena transexual?
2 – O bicho detesta o inverno. Não creio que vá para o Norte. Alaska?, nem pensar! Ele deve gostar de países tropicais, do verão, do Oriente Médio... areias, nômades, tribos, guerras... suas praias.
3 – O aparelhinho... será que foi ele quem inventou o monitoramento via satélite, a micro câmera? Será que ele está envolvido no Projeto Genoma?... não, não, é contra-senso...
4 – Será que ele se esconde no fundo do Etna ou outro vulcão que, quando está em erupção, define seu humor?
...
Bem, terminadas minhas interrogações, comecei a escrever um texto: assim:
“Pus o Diabo pra correr / Ele estava interferindo / No maior poema / Que pensara escrever”.
Não, não estava legal. Recomecei:
“666
Por que cê sempre sacaneia
Meu clímax na lua cheia
Até tu ser meu tema
No mais horrível poema.
666
É o número da senha,
Vá perturbar outro artista
Arranque os dentes com alicate
Sofra!
Xeque- Mate!
Não sou bandido
Nem parido de biscate,
Tu é fel na boca
Com invólucro de chocolate,
Nunca te disseram
Que combato no combate;
Quer saber
Judie-se de bondade,
Meu maior poema
Pra te foder
Escreverei na eternidade.
...
Virei o último gole de cahaça e pus-me a caminho de casa. Nossa, que surreal!
Meu Deus, que carnaval de horrores!

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Pinóquia

Pinóquia

Você sempre vem
Se não vem
Manda um recado me chama
Farrapos de desculpas me dá,
Aí minha ira inflama
E meu coração reclama
Que poderia ser outra
A vadia que eu amo
Que esquenta minha cama.

Você sempre vem
Nem me diz com quem
Flertou toda noite
Parada em vaivém
Num ponto qualquer
Duma estação de trem.

Mas te digo uma verdade
De agora em diante
Toda vez que o galo cante
Não te esperarei jamais

Ficarei entre as mariposas
Com meus parceiros sem esposas
Bebendo cachaça
Fazendo arruaça
Fazendo fumaça
Até meu último vintém.

Não venha mais
Ferir meus ideais
Quero me acabar
Na porta desse bar
Jogando conversa fora
Só me resta agora
Compor uma canção maneira
A mulher traiçoeira
Que desdenha dos meus ais.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

UM CARA SEM-TETO

UM CARA SEM-TETO


O CICLISTA PEDALAVA VELOZMENTE NA ALÇA DE ACESSO
À MARGINAL DO TIETÊ ALAGADA E DE TRÁFEGO PARADO.

QUERIA IR NA AVENIDA PAULISTA ASSISTIR A
PASSEATA GAY.

DEPAROU-SE, NA MARGINAL SENTIDO INTERIOR, COM UM
BANDO DE ATIVISTAS DO MST E SUAS BANDEIRAS E
BANDEIROLAS.

PENSOU:

UM SEM-TETO X CEM SEM-TERRA?

JUNTOU-SE AO MST.
JÁ NÃO IRIA JOGAR OVO CHOCO NOS GAYS.
IRIA PRA BRASÍLIA REINVIDICAR PRO LULA UM PEDAÇO
DE CHÃO COM ESCRITURA, PRA DEPOIS VENDÊ-LO E
CONTINUAR NA ESTRADA. PRECISAVA DAR SENTIDO À
SUA VIDA...

O QUE ELE NÃO SABIA É QUE OS GAYS DA PASSEATA
ERAM EXCLUÍDOS COMO ELE, EXCLUÍDOS DA VIDA COR-DE-ROSA
E, ALÉM DA INCLUSÃO SOCIAL, QUERIAM LIVRAR-SE DO
PRECONCEITO TENDO EM VISTA SEUS DIREITOS ADQUIRIDOS.

(Abuso de liberdade ao sonho que o nariz aponta,
não busca o bem geral, mas sim o individual.)

ENQUANTO ELE SEGUE A MARCHA POR REINVIDICAÇÕES, JUSTAS
ATÉ CERTO PONTO -- A ENXADA E O ARADO ENFERRUJAM NO CAMPO.


POIS É. CADA UM COM SUA CAUSA. VIVA A DEMOCRACIA!
EI, TOMARA NÃO VIRE MODISMO.

TEM UM AMIGO MEU, O ZÉ DO CONTRA, CONSANGUÍNEO DE
POLÍTICOS MORTOS DOS TEMPOS DITATORIAIS, EMBORA ELE
SINTA-SE DESONRADO PELO FATO, QUE ME DEU UMA IDEIA
GENIAL:

JUNTAR TODOS OS ATIVISTAS NUMA CARAVANA EM QUE TODOS
FANTASIADOS DE MIKEYS E DONALDS INVADAM E ARMEM SUAS
TENDAS LÁ NA DISNEYLÂNDIA.

DISSE-LHE:

"È. PELO MENOS SERIA INÉDITO, UMA NOVIDADE GLOBAL E
NÃO UM FATO CORRIQUEIRO."

O TEMPO

O TEMPO

A MUDA FEZ-SE ÁRVORE
E MUITOS FRUTOS DEU.

NÃO OS COLHI.
MORRI ANTES.
OUTROS SE DELICIARAM.

SERÁ QUE SE PERGUNTARAM
COMO ALI NASCEU
-- SE O TEMPO CRIOU O FRUTO
E MATOU QUEM A VIDA LHE DEU?


"SERÁ O TEMPO
O RESUMO VISÍVEL
MESMO SEM A INTERVENÇÃO HUMANA?"


O TEMPO É FUTURO.
O PRESENTE, O VÁCUO PENSANTE.
O PASSADO FOI A MUDA QUE PLANTEI.

MAS, SE JÁ MORRI
É PORQUE DESCOBRI
O TEMPO QUE PERDI
QUANDO ESTE ESCREVI.

limpando o caixilho de dejetos, limpando o caixilho de dejetos,

limpando o caixilho de dejetos,
sou o maior poeta do mundo. ponto. e daí?



sou o rio grande;
vocês, meus afluentes.
sou o tietê, de esgoto
esgotado de água pura
lesmando caudalosamente...
sou o sol
vocês, astros gravitantes
tal insetos no facho de luz.

e vosmecê é o quê?
fala o quê?...
inda prosas conservadoras
da borboleta azul?,
da florzinha amarela?,
meloso,
diz que vê a vida
de cima do muro...?

tem hora que
a barragem bufa,
transborda,
transforma o quadradismo
de mentiras ilusórias,
aleatórias, provisórias,
peremptórias...


olha lá, hein!
aaláá, aalá, olha!...
que Alá cá do meu lado,
endiabrado
em dia de brado,
aflija-me com raios
se a porra do caralho
que sai da minha caneta
seja só o mau hálito
e o suor fétido
duma canção horrorosa
de quem não fica
vendo a banda passar.

digo:
sou o tietê,
sou você,
sou vosmecê.
sou o fio da barba
do trato inescrito
(não preciso assinar este texto).

isso!
defequem palavras!
brasas!
vitupérios!
berrem ao meu ouvido palavrões
pichados na parede memorial!
façam um poema sujo, maldito!
rosnem feito cães impacientes!
faxinem seus podres!

ah, dirão os intelectuais
meneando as cabeças
com seus contrastes clausurais:
-- que texto imbecil!
-- que revolta sem causa!
-- de nada acrescenta à literatura,
às belas artes!

sim, deletem!
viva a mesmice!
vivaaaaaaaaaaa!
viva,
mexi os pauzinhos,
notaram meu ostracismo, viva!
(será que estão irriquietos
agitando a bunda gorda na cadeira?...)


sou mesmo libertino.
até fornicando faço versos
lindos, incoerentes, sanguinários...
e ao salafrário
que quiser me contestar, replico:
lá no necrotério
vi um corpo indigente em decomposição,
pensei:
hum, sal grosso,
a churrasqueira em brasa...
poesia numa hora destas, como?

de que vale gritar,
blasfemar, amar?...
tudo é sem sentido.
já não me dói revê-lo morto,
nem o que foi e porquê.
dói-me rever o corpo,
a última visão
do final comum...

em resumo:
o resto que inda prezo
ao que inda presto...
o resto é um saco de palavras
flutuando na merda.

vou fechar a latrina
para escrever textos aprazíveis.
tenho que formatar a mente.
acabei de passar o antivírus.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Clamor a qualquer Maria que me vem

Clamor a qualquer Maria que me vem

Amor,
reverso da guerra
que a frivolidade perde,
se não corre nas veias
tal água apressada na terra
que à sede incontida o leve;

Amor,
tempo natural
que minha maria sonha
no viver de tê-lo eternal
mesmo que o mal
seja o veneno da peçonha
da frieza plural

mas virginal

ela vem a mim doá-lo,
flerto com o futuro
e juro
pelo menino que guardo
no imo pueril
que o céu cinza se evapora
vindo-me o olhar anil

orando ao querubim
sentindo-me homem
quando ela por amor
gruda-se em mim;

Amor,
reverso do verso fúnebre
sara à solidão do abatido
se o amor incontido
resume a paz
da paz do amor
ao novo ânimo parido;

Amor,
reverso do dom insentido
vive à sombra da fúria
gigante
esquecido;

"ó maria
teu amor me contagia
sempre me virá
se estiveres comigo
nas lutas que tenho perdido,
não são as dores meu castigo
se morrer por teu amor
já a guerra terei vencido;"

o que mais dizer
se por amor tenho crescido
e já não choro no canto escondido
no canto cego a me desdizer
do amor
do amor de teu ser;

Amor,
na dose certa
alerta
a quem inda o esqueça,
e mesmo a conta-gotas
que eu jamais esmoreça
mantendo a porta aberta
para que preencha
o vazio de minha cabeça,

"vem maria
apagar meus fiascos
meus relaxos
ensinar-me a amar,
vamos em duo divagar
bem devagar
mesmo que por telepatia,

vem maria
o tempo é pouco
pouco tempo
o sonho anuncia..."

camaleão

camaleão



se o poema não atua e voa
ao anjo que carrega a cruz,
a frase que declamo à toa
cega-se ao foco que reluz,

o bicho bichado ora destoa
do meu imo parindo a flux,
se alçado de minha pessoa
a vida nua e crua me induz

ao reino caído e sem coroa
noutra face atrás do capuz
se convém à saga camaleoa
camuflar e maquiar toda luz,

eus mensageiros o meu coa
um à mentira que me seduz.

Preciso Chegar em Fugacity

Preciso Chegar em Fugacity

A ave nômade voa no cubículo, irriquieta.
Desesperada foca a aerofotogrametria de plagas
inexistentes num tour.

Delira. Vê-se remando solitária a ilhas que vão
se desmoronando e, em círculos, rema e rema
voltando ao ponto de origem.

Inerte, pensares brancos a sufocam e a detém
num intervalo memorial de pulsação lenta.

Impaciente com a calmaria a irritá-la, atravessa os
cômodos da casa térrea pra zanzar na cozinha.

Toma um café, fuma um cigarro.
Fuma outro cigarro, toma outro café.

Abre a porta. Vê as lanternas dos pararraios e antenas
dos prédios: vermelhas, amarelas.

Pensa:

"Lá na frente tem uma plataforma no chão tátil, acima
de todas as cabeças, onde a soledade me espera e faz
morada. "

A ave está livre do cubículo cotidiano.

"As setas do labirinto me levam ao reverso deste cenário
absurdo. Preciso chegar em Fugacity. Preciso remar.
Preciso chegar em Fugacity, preciso."